ESCLARECENDO A PORTARIA MTP Nº 1.467/2022

01 de setembro de 2023

O direito à contagem recíproca do tempo de contribuição para efeito de aposentadoria está assegurado no § 9º do art. 201 da Constituição Federal.

Entende-se por contagem recíproca o cômputo, para concessão de aposentadoria em um regime de previdência, do tempo de contribuição anterior a outro regime. A efetivação da contagem recíproca gera o direito a crédito para o regime instituidor em relação ao regime de origem, que será obtido por meio da compensação financeira entre os regimes previdenciários, sendo a certificação do tempo de contribuição a pedra basilar para a efetivação da contagem recíproca de tempo de contribuição e a consequente compensação financeira entre regimes previdenciários, tendo assento no campo infraconstitucional - com previsões que também são aplicáveis aos RPPS - no art. 96 da Lei nº 8.213, de 1991.

Destaca-se do art. 96 da Lei nº 8.213, de 1991, a previsão contida no seu inciso VI, replicada no caput do art. 196 da Portaria MTP nº 1.467, de 02 de junho de 2022, no sentido de que a CTC somente poderá ser emitida para ex-segurado do RPPS, previsão esta que possui fundamento nas particularidades do vínculo do servidor titular de cargo efetivo com o ente federativo, posto que não é consentâneo com os princípios jurídicos da Administração Pública permitir que o servidor estatutário adquira, com a aposentadoria, duplo status funcional: ativo e inativo em relação ao mesmo cargo público.

Por este motivo, era comum a previsão nos estatutos funcionais da vacância do cargo como consequência da aposentadoria, em qualquer regime previdenciário, regra que foi elevada ao status constitucional pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019, com eficácia plena e aplicabilidade imediata, na previsão do § 14 do art. 37.

Isso porque era frequente que servidores efetivos pretendessem se aposentar pelo RGPS utilizando parte do tempo cumprido no cargo efetivo, com amparo no RPPS, mantendo-se no exercício do cargo efetivo com a vinculação ao RPPS. As diferenças de critérios exigidos no RGPS e no RPPS e a possibilidade de aplicação do instituto da contagem recíproca do tempo de contribuição, incentivavam o servidor público vinculado ao RPPS a buscar sua aposentadoria no RGPS, a depender de sua situação individual. Ademais, o tempo no serviço público não utilizado, ou o tempo posterior à concessão de aposentadoria pelo INSS poderia ser utilizado para obtenção de outra aposentadoria no RPPS, especialmente aposentadoria por idade e compulsória.

Disso resulta que, se fosse permitido emitir CTC a servidor que permanecesse no exercício do cargo efetivo, o ente federado arcaria com duplas consequências financeiras: o pagamento da compensação, na forma da Lei nº 9.796, de 1999, relativamente ao tempo de contribuição que certificou e que foi computado para fins de aposentadoria no RGPS, e o custeio de um segundo

 

benefício, por idade ou decorrente do risco previdenciário, tais como aposentadoria por invalidez e pensão por morte.

A possibilidade de emissão de CTC apenas para ex-segurado do RPPS busca inibir justamente tais situações, considerando a previsão contida no art. 40, caput e § 6º, da Constituição Federal bem como a ocorrência dos problemas apontados por diversos entes federativos relativamente ao desequilíbrio financeiro e atuarial causado pela emissão de CTC para servidores que pretendiam se aposentar no RGPS com cômputo do tempo do cargo público efetivo mantendo-se no exercício desse cargo com vinculação ao RPPS para mais tarde usufruir de aposentadoria também no RPPS, em decorrência do mesmo cargo.

Nesse sentido foram minimizadas tais distorções ao ser positivado que, enquanto o servidor estiver amparado por RPPS por ser titular de cargo efetivo, não se emite CTC relativamente ao tempo cumprido nesse cargo. A certificação exige a prévia vacância do cargo, pois o servidor titular de cargo efetivo possui um vínculo institucional com o ente federativo, que se extingue com a aposentadoria pelo RGPS ou por RPPS, conforme previsão expressa no § 14 do art. 37 da Constituição Federal, replicada no art. 170 da Portaria MTP nº 1.467, de 2022.

Dessa forma, conclui-se que se na concessão da aposentadoria no RGPS for utilizado, mesmo que de forma fracionada, tempo de vínculo do servidor no cargo efetivo, a extinção do vínculo funcional deve ocorrer.

A condição previdenciária do servidor amparado em RPPS que titulariza dois cargos é diferente da situação dos segurados do RGPS que exercem duas ou mais atividades. Quando uma pessoa exerce, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada, sendo ambas de vínculo obrigatório com o RGPS, sua contribuição previdenciária ao RGPS incidirá sobre a soma dos salários-de-contribuição de todas as atividades de vínculo com o RGPS, até o limite máximo estabelecido para esse salário.

Dessa forma, no RGPS, os períodos de atividades concomitantes compõem um único vínculo (com um único “tempo de contribuição”), e lá poderão gerar um único benefício de aposentadoria ou a emissão de uma única CTC, razão pela qual o RGPS não concede dois benefícios e não certifica, para fins de contagem recíproca, tempo de contribuição separadamente em atividades distintas, quando concomitantes, e não se considera mais de um vínculo previdenciário quando há mais de uma atividade.

Nos RPPS, os procedimentos em relação ao servidor que exerce mais de um cargo efetivo, licitamente acumulável, diferem do RGPS, pois a incidência de contribuição ocorre em relação a cada cargo acumulável, separadamente, de modo a constituir dois vínculos com Regime Próprio, um de cada cargo. Não se somam as remunerações de contribuições de cargos distintos e essas não são limitadas ao valor máximo de salário de contribuição estabelecido para os segurados do RGPS. Sendo possível, inclusive, gerar duas aposentadorias no Regime Próprio, uma em cada cargo público acumulável, mesmo que tenham sido exercidos concomitantemente. Sendo lícita a acumulação dos cargos, lícita será a acumulação das aposentadorias deles decorrentes.

Assim, a possibilidade de acumulação lícita de dois cargos, nos termos do inciso XVI do art. 37 e do § 6º do art. 40 da Constituição Federal, e, por conseguinte, de duas aposentadorias à conta de RPPS, permite que, quando solicitado por ex-segurado que mantém filiação a 2 (dois) RPPS ou 2 (dois) vínculos funcionais com filiação ao mesmo RPPS e ao RGPS, seja emitida CTC única com destinação do tempo de contribuição para, no máximo, estes três regimes previdenciários ou dois vínculos, segundo indicação do requerente, conforme prescreve o art. 192 da Portaria MTP nº 1.467, de 2022.

 

Nesse sentido, as normas previdenciárias (infraconstitucionais e infralegais) estabeleceram regras e mecanismos para possibilitar a realização de contagem recíproca de tempo de contribuição para efeito de aposentadoria em dois cargos acumuláveis com filiação ao RPPS, abrindo a possibilidade de emissão de CTC, também no âmbito do RGPS, com fracionamento do tempo certificado para destinação a RPPS de até dois entes federativos ou para o RPPS de um mesmo ente federativo para averbação nos dois cargos acumulados, como prevê o art. 511 da Instrução Normativa PRES/INSS nº 128, de 28 de março de 2022.

Dessa forma, na CTC emitida por RPPS deve conter a informação acerca da vinculação legal do servidor com o RPPS, a qual será prestada mediante a indicação da legislação do ente federativo que fundamenta a vinculação do servidor ao RPPS durante o período certificado. Portanto, certifica-se o tempo do vínculo, ou seja, o tempo total de vínculo com o RPPS, ainda que se destine uma parte desse tempo para utilização em um cargo ou ente/regime e outra parte para utilização em outro cargo ou ente/regime. O art. 191 da Portaria MTP nº 1.467, de 2022, orienta o procedimento em caso de emissão de CTC com fracionamento do tempo de contribuição e destinação a outros regimes.

Como detalhado acima, as normas vigentes possibilitam a emissão de CTC única (do tempo total de vínculo) com fracionamento do tempo apenas na hipótese de acumulação de cargos públicos ou acumulação de cargo público com atividade privada, ou seja, nas situações em que há, simultaneamente, mais de um vínculo previdenciário, podendo decorrer uma aposentadoria de cada vínculo.

A emissão de CTC pelo RPPS poderá ser efetivada, somente mediante requerimento formal do ex-segurado do RPPS e relativamente a períodos em que tenha havido, por parte dele, a prestação de serviço ou a correspondente contribuição, conforme previsão contida no inciso VI do art. 96 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 e caput do art. 196 da Portaria MTP nº 1.467, de 02 de junho de 2022. Assim, não cabe a emissão de CTC do RPPS para segurado ativo ou aposentado (beneficiário) neste regime.

As possibilidades de fracionamento do tempo de contribuição no RPPS e, de forma recíproca no RGPS, previstas, respectivamente, no art. 192 da Portaria MTP nº 1.467, de 2022 e no art. 511 da Instrução Normativa PRES/INSS nº 128, de 28 de março de 2022, pressupõem que os períodos de contribuição fracionados sejam destinados à averbação em cargos públicos acumuláveis, de acordo com regras previstas no art. 37 da Constituição Federal, sendo a licitude do acúmulo uma condição necessária para o possível fracionamento do tempo de contribuição na CTC única emitida pelo RPPS de origem para o ex-segurado.

A vedação à emissão de CTC relativa a tempo de vínculo em que o segurado do RPPS se encontra em atividade prestigia o equilíbrio financeiro e atuarial dos Regimes Próprios de Previdência Social exigido pelo art. 40, caput, da Constituição Federal, evitando que um único vínculo previdenciário dê origem a concessão de benefícios em mais de um regime previdenciário.

 

*Nota divulgada no Informativo mensal dos RPPS - 36ª edição - Ago/2023

Disponível em: https://www.gov.br/previdencia/pt-br/assuntos/rpps/legislacao-dos-rpps/esclarecendo-a-portaria-mtp-no-1-467-2022

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